terça-feira, 29 de abril de 2008

Tempestade

No meio de ventos que me fazem perder a noção de onde estou, oiço trovões que me ensurdecem, vejo-me debaixo da chuva que me molha a alma seca e suplico por mais.

Quero a intensidade do gelo que me corta a pele, quero sentir o vento puxar-me para trás impedindo-me dessa forma de avançar para o abismo que se aproxima. Quero navegar naquele oceano louco de raiva, usando as mais portentosas embarcações como joguetes nas suas mãos, ludibriado pelo seu poder. Desejo desejar, ultrapassando assim a dormência e poder sentir de novo o sangue correr-me nas veias como louco.

Quero vergar e não partir, se isso não me fizer sufocar, se isso não me fizer perder o ar que me mantém vivo, para depois acordar e sentir o sentido da vida, então não verei resultados nas minhas acções mundanas.

Anseio ultrapassar o inferno, olhar o diabo nos olhos e rir-me dele, quero sentir o prazer de me queimar na sua pele enquanto o esbofeteio, com a luva de pele com que nasci, e dizer-lhe, de seguida, que não conseguiu.

Gritarei com Deus, com Zeus, com Buda e Alá, insinuando-lhes a verdadeira loucura que nasceu comigo naquela tempestade de fogo, que me marcou os olhos, que me marcou a pele, que me impregnou a alma.

Desejo a sensualidade da última dança a percorrer-me cada poro da minha pele, levando-me pelo mesmo instinto carnal, que me leva a beijar-te os lábios com a paixão de uma vida só, da única vida a que temos direito, por leis que não são as nossas e que nos fazem passar os anos ansiando o entranhar da morte vinda numa barca qualquer, ultrapassando qualquer tempestade que se lhe atravesse no caminho.

Sem atrasos, na hora certa ela lá estará com o seu robe negro, e eu sorrindo, lhe direi que também eu venci o disforme Adamastor, e que assim como ela, estou pronto para a tempestade que se segue.

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